FUI ENGANADO PELOS AMIGOS DO RUBENS JARDIM

Olá, amigas e amigos!
Para lembrar do nosso amigo poeta Rubens Jardim, aqui deixo o texto que escrevi em 15 de maio de 2024 no feicebuque, compartilhado no mesmo dia pela Ana Maria Leitão, pessoa que muito admiro. Um abraço e boa leitura.
Ontem amigos e amigas do poeta Rubens Jardim me convidaram para o seu velório na Avenida Doutor Arnaldo. Chegando lá, descobri que haviam me enganado: não era um velório, era um grande sarau em homenagem ao Rubens. O mais emocionante de todos os saraus. O homenageado, que pouco falava nos encontros que promovia, o poeta de enorme coração e suprema humildade, que em vez de falar muito preferia ceder o palco para todos ao seu redor, ontem nada falou. Não gritou, não esbravejou, não soltou palavrões, não se mostrou indignado com o que estão fazendo com o nosso país e o nosso povo. Estava calmo, sereno, nos ouvindo. O tempo todo mudo, observando e sendo observado. Peguei nas suas mãos, toquei nos seus cacheados e volumosos cabelos brancos, beijei seu rosto e o abracei junto com o Sergio Ravi Rocha Odin, a Adnyce Oliveira, a Shirlene Holanda e a Marina Ruivo. O rodeamos para nos debruçarmos no seu peito neste abraço conjunto. Um gesto de despedida no poeta que abraçava a todos e que naquele momento estava de viagem marcada, convocado para continuar promovendo encontros em outras galáxias. Ontem não fomos ao velório em homenagem ao Rubens Jardim, não; fomos ao sarau preparado em segredo pelos seus amigos exclusivamente pra ele. De surpresa exatamente como quando fizemos um livro que a Patuá publicou em sua homenagem e ele nem desconfiou de nada até a noite do lançamento. Ontem ele, que sempre homenageou tanta gente a vida toda, foi o centro das atenções. Dezenas de amigas e amigos em torno de um homem iluminado. Muitos leram seus poemas e textos de outros amigos e amigas, contaram histórias, cantaram, se emocionaram. Ninguém ouviu quando falei no ouvido dele o quanto ele foi e será eternamente importante pra mim e pra todos nós. Ninguém me ouviu também, porque não precisei mover os lábios para ser o portador de um recado do Cesar Augusto de Carvalho, um dos seus mais ilustres amigos, que estava longe e tristíssimo por não ter podido comparecer. O Cesar, que esteve sempre com ele em quase todos os lugares, neste último sarau ficou arrasado pela tristeza de não ir. O Arnaldo Afonso nos emocionou o tempo inteiro com o seu violão e o seu canto, muitas vezes acompanhado pelo imenso coral em volta, fazendo pulsar de emoção os corações da Ana Maria Leitão, esposa do Rubens, dos seus filhos, irmãos, netos, amigos… O amigo de tantos saraus, o Claudio Laureatti, não conseguiu conter as lágrimas ao chegar e ler alguns poemas. A emoção estava presente nos olhos e na voz do Luis Avelima, do Celso de Alencar, da Aline Araujo, do Fabiano Fernandes Garcez, do Eduardo Lacerda, da Pricila Gunutzmann, da Betty Vidigal, do Valdir Rocha, da Dione Barreto, do Carlos Galdino, do Jose Antonio Goncalves e de todos enfim que estavam ontem à noite ali na Avenida Doutor Arnaldo. Me perdoem, mas éramos tantos, que os nomes não caberiam neste espaço.
Rubens Jardim, o poeta que carregava o céu nos olhos, o vate inconformado e rebelde, o semeador de palavras, sempre iluminando os caminhos da poesia pra todos, ficou o tempo inteiro em silêncio, não sabendo – ou fingindo não saber – que era ele quem estava naquele palco, e não nós, era ele quem estava nos emprestando a vez e a voz, como na sua vida toda ele fez, qual um bandeirante da palavra.
Parafraseando um dos seus poemas, digo que ele veio, viu, viveu e, com a sua arte-manha, me “deu gás” pra continuar vivendo.
Um abraço de gratidão de todos os seus amigos e amigas, Rubão.
Lapa, São Paulo, madrugada de 15 de maio de 2024.
SOBRE A POESIA DO RUBENS JARDIM
O que alguns ilustres escritores mineiros escreveram sobre a poesia do igualmente ilustre jornalista e poeta paulistano Rubens Jardim:

“Poeta Rubens Jardim: deixo de responder à sua carta-desencanto porque a melhor resposta lhe foi dada por você mesmo, em Espelho Riscado, cadernos de poesia-2. A poesia é exatamente o projeto de solução que encontramos para os desencontros e absurdos do mundo. E você dá bravamente o recado, em seus versos. Portanto, é seguir em frente, com as armas da lucidez e da esperança.”
Carlos Drummond de Andrade, Itabira-MG, 31 de outubro de 1902 – Rio de Janeiro-RJ, 17 de agosto de 1987)
“Rubens Jardim solucionou, ao seu modo, e de maneira criativa uma série de impasses vividos pela poesia nas últimas décadas.
Neste livro ele se dá uma liberdade rara transitando entre as mais variadas formas. Pode-se dizer que ele faz uma síntese do que seria o poema-cartaz, o hai-kai, o poema-piada, o caligrama, a publicidade e o poema convencional. Pode tanto produzir um poema com o mínimo de palavras ou letras, como um magnífico soneto. Pode compor um poema voltado para problemas sociais ou para a repressão política, ou pode dedicar-se à sua infância e a temas subjetivamente familiares. E tudo com a desenvoltura de quem sabe o que está fazendo.”
Affonso Romano de Sant’Anna, Belo Horizonte-MG, 27 de março de 1937)
“Rubens é o poeta de hoje, definitivo e consumado. Ele só seria o poeta do futuro – como gostam de prever os críticos de rugas e casaca – se a arte admitisse progresso.”
Flávio Márcio Salim (Juiz de Fora-MG, 1945 – São Paulo-SP, 1979).
“Não é fácil fazer-se uma antologia. Notadamente no caso de Jorge de Lima, poeta de várias fases e várias faces. Isso você conseguiu e com galhardia!”
José Dantas Motta (Carvalhos-MG, 22 de março de 1913 – Rio de Janeiro-RJ, 09 de fevereiro de 1974)
Rubens Eduardo Ferreira Jardim (São Paulo, 25 de maio de 1946 – São Paulo, 13 de maio de 2024) foi um jornalista e poeta brasileiro. Publicou poemas em diversas antologias no Brasil e no exterior. Autor de cinco livros de poemas: ULTIMATUM (1966), ESPELHO RISCADO (1978), CANTARES DA PAIXÃO (2008), FORA DA ESTANTE (2012) e ANTOLOGIA DE POEMAS INÉDITOS (2018). Organizou e publicou JORGE, 80 ANOS (1973) – uma espécie de iniciação à parte menos conhecida e divulgada da obra do poeta alagoano e que foi o pontapé inicial do ANO JORGE DE LIMA, em comemoração aos 80 anos do nascimento do poeta, evento que contou com o apoio de Carlos Drummond de Andrade, Menotti del Pichia, Cassiano Ricardo, Raduan Nassar e outras figuras importantes da literatura do Brasil. Integrou o movimento CATEQUESE POÉTICA, iniciado por Lindolf Bell em 1964, cujo lema era: o lugar do poeta é onde possa inquietar. O lugar do poema são todos os lugares. Organizou e publicou em 2022 pela Editora Arribaçã a coletânea AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA, reunindo 328 nomes de mulheres de várias regiões do país.
Fez parte do Catequese Poética, movimento iniciado por Lindolf Bell em 1964 com o objetivo de tirar a poesia das gavetas, tornando-a mais acessível através de apresentações, declamações, conferências e debates nas ruas e em universidades. No início o palco era a praça, pois dali extraía-se o pedestre de seu rumo anônimo e indeterminado, reavivando sua condição de homem, cidadão. Como prova desta identidade humana, anos depois Milton Nascimento passou a cantar “o artista tem que ir aonde o povo está”.
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